segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Andanças gregas...

Tem sido sempre assim. Em cada viagem de recreio procuro ir mais além do roteiro turístico, aproveitando o estar e ver para perscrutar o lado menos óbvio do destino.

E foi assim na Grécia, particularmente em Atenas - que é onde tudo acontece nesse estranho país de contradições, entre a História, a beleza natural e uma miséria que se percebe na vida das gentes.

Atenas é uma cidade feia, suja, maculada pelo mau gosto arquitectónico, pelo caos urbanístico. Percebe-se não haver ali grande preocupação com a qualidade de vida dos cidadãos e, recorrentemente, surge a interrogação pertinente: que destino terá sido dado aos fundos comunitários que noutros países foram canalizados para a requalificação urbana?

Apesar de não me ter cruzado com nenhuma manifestação, nem haver sinal de qualquer "perigoso revolucionário" em cada esquina, há um sentimento latente de indignação e revolta pelo desgoverno dos políticos do poder. E uma estrutura psicológica receptiva a discursos de radicalização.

O Partido Comunista da Grécia (KKE), os grupos residuais do que resta da extrema-esquerda e os movimentos anarquistas - com algumas tradições no movimento operário -, adquiriram, nos últimos meses, um crescimento e influência assinaláveis, isolando os velhos dirigentes sindicais ligados ao PASOK, tradicionalmente o maior partido da "esquerda" grega, hoje no poder.

Nas ruas, a polícia não passa despercebida. Pelo contrário, afirma-se ostensivamente - e percebe-se o incómodo de quem passa -, exibindo metralhadoras e um aparato bélico mais próprio de uma qualquer ditadura latino-americana dos anos setenta...

O aparato e a pose arrogante, ao contrário do que alguém mais desatento possa aferir, não se destinam a dissuadir a criminalidade ou eventuais ataques terroristas, servem objectivamente para constrangir cidadãos e revelam o pânico que invadiu a liderança grega, da política à finança. E é o medo da revolta social que determina a presença policial, que nos faz remontar às imagens a preto e branco das memórias colectivas da ditadura dos generais.

Não fora a lógica grupal que domina a esquerda grega, o sectarismo endémico que a corrói como gangrena, e as respostas sociais à crise poderiam crescar e construir alternativa séria às políticas neo-liberais, abrindo até possibilidades de alastramento da revolta social a outras capitais europeias, largando lastro para um resposta global dos trabalhadores e dos povos num quadro de uma nova Europa.

António Alte Pinho

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