quarta-feira, 30 de junho de 2010

Concentração de Protesto

A PLATAFORMA ANTI-GUERRA, ANTI-NATO APELA À PARTICIPAÇÃO NUMA CONCENTRAÇÃO DE PROTESTO A REALIZAR NO DIA 2 DE JULHO (SEXTA-FEIRA), PELAS 9H30, EM FRENTE AO MINISTÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, NO LARGO DO RILVAS

NATO e Rasmussen vão embora!

Sexta-feira, dia 2, o secretário-geral da Nato, Anders Rasmussen, vem a Portugal, entre outras coisas, para “ouvir” as autoridades portuguesas sobre o novo conceito estratégico da NATO. Este será debatido na próxima cimeira daquela organização belicista e agressiva que se realiza no mês de Novembro, em Lisboa. A PAGAN manifesta-se energicamente contra a presença de Rasmussen em Portugal e, mais uma vez, contra a realização daquela cimeira imperialista no nosso país.

A Plataforma Anti-Guerra Anti-Nato (PAGAN) é uma plataforma que reúne pessoas e articula movimentos pela criação, apoio e divulgação de acções não-violentas contra o militarismo, a guerra e a NATO. Actualmente, a PAGAN está a organizar uma Semana de Acção anti-NATO, onde se prevê a realização de sessões públicas, debates e comícios, que contarão com a presença de activistas nacionais e internacionais. É objectivo desta iniciativa discutir a guerra, a NATO, o Afeganistão, as armas nucleares, o Tratado de Lisboa e o novo conceito estratégico da NATO.

Tropas portuguesas fora do Afeganistão!
NATO e Rasmussen vão-se embora!

PAGAN, Lisboa, 30 de Junho de 2010

A esquerda morreu! Viva a esquerda!

À tese da crise objectiva do capitalismo, declarada por ele próprio, no fim do ano de 2008, seguiu-se a prova de que nenhuma ideia de esquerda sobejou do colapso da ex-URSS. Repararam na satisfação com que tanto cretino (à esquerda e à direita) se lembrou de dizer o óbvio: que Karl Marx afinal sempre teria tido razão? O que não disseram foi que o Marx foi um revolucionário a surfar uma revolução. Mas o que fazer quando não há revolução na rua e se quer ser de esquerda?

Distraído como sou, imaginei que a queda do muro de Berlim significasse para o debate de ideias uma libertação. Na altura tudo estava condicionado: ou se era a favor do capitalismo ou a favor do socialismo, como se apenas existissem duas ideias correspondentes a duas realidades (o que era manifestamente estúpido, mas era assim que se pensava, seja o vulgo sejam os cientistas sociais). A liberdade, porém, não é o estado natural das sociedades abandonadas a si próprias. Caso não existam movimentos de libertação não há liberdade. E o que temos visto na era pós-colonial são movimentos de libertação – muito associados a processos de individuação, lá onde haja condições para tal – a que também chamamos (erradamente) movimentos sociais (por vezes sociedade civil, solidariedade, etc.) mas fora de qualquer perspectiva socialmente revolucionária.

Em Portugal, em particular, a perspectiva de emprego já não é uma perspectiva de trabalho. Como se costuma dizer, os portugueses recusam-se a fazer certos trabalhos e, portanto, recusam-se a sacrificar-se pela sociedade, com o risco de perderem um pouco o sentido das realidades, de tal maneira as realidades são encobertas com camadas de informação.

Alguém dizia que caso Portugal queira ou seja obrigado a sair do euro o valor das mercadorias no País seria imediatamente reduzido a um terço (ou mesmo um quarto) do valor actual. O que quer dizer que a nossa estadia no Euro fez crescer especulativamente o valor à nossa disposição por 3 ou 4 vezes, de que alguns espertalhaços aproveitar mais que os outros. Mas afinal a economia, numa grande medida, é política e poder em estado puro. O poder de a zona euro aceitar lidar com os portugueses (e com cada um dos outros países) lá para os fins económicos que entendem ser bons para quem lá mande naquilo. Ora, será a esquerda capaz de dizer aos portugueses como se devem comportar em tais circunstâncias? A mim parece-me que não. Porque os portugueses, apesar da falta de educação, não são parvos, como nenhum povo no mundo. E compreende muito bem ser verdade aquilo que a direita lhes diz: “nós somos do primeiro mundo!” As expectativas de vida que a generalidade dos portugueses imaginou em jovem foram em grande medida ultrapassadas pela realidade.

Nos países europeus mais habituados a viverem no centro do capitalismo, onde as expectativas de vida são decrescentes faz pelo menos vinte anos, a reacção dos povos à situação actual também não é revolucionária. A crise objectiva – isso é mais que evidente – não produziu numa crise subjectiva. Verificado isso mesmo, passados alguns meses após a declaração oficial da crise, a direita volta ao ataque e impõe a continuação e aprofundamento da política anteriormente seguida. Porque haveriam de mudar ou sequer puxar pela cabeça se não têm oposição.

Ser de esquerda, nos dias de hoje é um pouco vergonhoso. Por isso os jovens preferem ser de direita, da mesma maneira que muitos “gostam” do Benfica. Tal partido vem de mais longe, tem mais tradição e está a ganhar os campeonatos. Por isso, também, encontramos na actividade cívica e política barreira geracionais importantes, que implicam a necessidade de um trabalho em profundidade à esquerda, sobretudo na crítica teórica e também na prática de mobilização, para poder vir a ter possibilidades de mudar de rumo algum dia.

O estado a que a esquerda chegou está bem patente nas eleições presidenciais que aí vêm: o antigo candidato dos “movimentos sociais” tornou-se o defensor do desacreditado Sócrates, na esperança de o PS voltar a ser um partido com ambições à esquerda. A esquerda propriamente dita, essa, está fora de jogo. Perdoem-me os comunistas por não os meter nesta equação, mas a minha ambição para a esquerda é a de assumir a governação, caso venha um dia a saber o que fazer em tal posição.

António Pedro Dores

terça-feira, 29 de junho de 2010

O que falta à Esquerda?

Nunca como hoje as Esquerdas extra-parlamentares tiveram condições para apresentar uma candidatura às presidenciais, porque nunca como hoje estas Esquerdas tiveram uma posição comum. Ou seja, independentemente da área ideológica, há o reconhecimento da necessidade de:

1. Levar o protesto social às eleições;
2. Apresentar uma candidatura democrática, socialista e anticapitalista.

Acresce a este facto a circunstância de, nesta área, ainda não ter surgido nenhuma candidatura associada a uma organização (como em outras ocasiões ocorreu), nem seja previsível que tal venha a acontecer tendo em conta o tempo útil necessário para a formalizar.

É por demais evidente que uma candidatura, nascida das premissas enunciadas, teria condições não só de unir as várias Esquerdas extra-parlamentares, como para alargar a sua base social de apoio a eleitores de outras Esquerdas que não se revêem nas candidaturas já anunciadas.

E seria até criminoso que, perante esta situação, estas Esquerdas não aproveitassem a oportunidade de, pela primeira vez globalmente, não terem de votar útil ou de engolir o sapo “menos mau”…

Por outro lado, o surgimento de uma candidatura desta natureza, ao contrário de “dividir a Esquerda”, como alguns gostam de argumentar (como se a Esquerda fosse “chapa 5” de uma entidade única), levaria às eleições o eleitorado que não se reconhece no candidato de Sócrates e da direcção do Bloco de Esquerda, nem no candidato do PCP (seja ele/a quem for).

Falta à Esquerda unir-se em torno de um programa mínimo, rompendo necessariamente com a cultura da candidatura de grupo, e corporizar o programa numa personalidade (mais ou menos conhecida, pouco importa) que concite a concordância de todas as organizações e cidadãos envolvidos no processo de debate que tem decorrido e vai continuar, nomeadamente na Assembleia de 10 de Julho, a ter lugar no Palco Oriental, em Lisboa.

António Alte Pinho

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Os obedientes cães de guerra

Portugal vai enviar mais meios militares para o Afeganistão no Outono. O ministro da Defesa Augusto Santos Silva confirmou que já foram feitos estudos para fundamentar a decisão que o Governo irá apresentar em breve ao Conselho Superior de Defesa Nacional e à Assembleia da República. Segundo o ministro da Defesa o dinheiro gasto com os militares portugueses destacados no exterior «é bem gasto». O governante afirmou que as forças portuguesas no estrangeiro representam «aumento de prestígio e melhora a imagem de Portugal no mundo».

Dinheiro gasto para ajudar os portugueses mais pobres são gastos que o país não pode sustentar, mas gastar milhões numa guerra sem justificação é dinheiro “bem gasto”. Ir para o “cu de Judas” matar gente que não nos fez mal nenhum, só porque há interesses económicos dos Senhores do Mundo, aumenta o prestígio de Portugal. Muitos ficarão imensamente satisfeitos quando amanhã comerem um bom prato de “prestígio” ao almoço.

Publicado em WEHAVEKAOSINTHEGARDEN http://wehavekaosinthegarden.blogspot.com/

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Rosa Luxemburgo

Polaca, nascida em 5 de Março de 1871, envolveu-se desde muito jovem em actividades estudantis, lutando contra o sistema repressivo então vigente nos colégios da Polónia. Militante activa do movimento socialista, teve que deixar seu país em 1889 para não ser presa; em Zurique fez seus estudos sobre economia, concluindo essa fase de aprendizado com uma tese de doutorado sobre "O Desenvolvimento Industrial na Polónia".

A partir de 1894, juntamente com Leo Jogiches, Rosa Luxemburgo dedicou longo período de luta contra a visão nacionalista do Partido Socialista Polaco, assumindo a liderança na criação da Social-democracia do Reino Unido da Polónia.

Mas é a partir de 1898, com sua transferência para a Alemanha, que Rosa Luxemburgo se torna personagem destacada entre os socialistas europeus.

Nesse período participa numa das principais polémicas do movimento operário internacional, na medida que se contrapõe aos artigos de Eduard Bernstein, produzindo um competente e actual material contra o revisionismo e o reformismo, transcrito na obra "Reforma ou Revolução". Durante o período da polémica, Rosa afirma que, de facto, o movimento dos trabalhadores deveria lutar por reformas, mas que isso não bastaria para abolir as relações capitalistas de produção - o movimento operário jamais poderia perder de vista a conquista do poder pela revolução.

Outro momento importante na vida da militante Rosa Luxemburgo deu-se durante os primeiros anos no início do século, quando da discussão sobre a organização dos socialistas. Naquela altura polemiza com Lenine sobre a organização do Partido Social-Democrata dos Trabalhadores Russos. Na verdade, faz uma contundente crítica à sua proposta, expressa no conhecido texto "Um passo adiante, dois passos atrás". Em 1904 Rosa produz um texto sob o título "A Questão da Organização da Social-Democracia Russa", onde afirma: "O ultracentralismo defendido por Lenine aparece-nos como impregnado não mais de um espírito positivo e criador, mas sim do espírito do vigilante nocturno".

Há historiadores que afirmam que é a partir da revolução de 1905 na Rússia que Rosa Luxemburgo desenvolve sua teoria revolucionária. O certo é que sua publicação de 1906, "Greve de Massas, Partido e Sindicato", constitui-se até hoje numa das principais peças teóricas sobre partido e movimento de massas – "A revolução russa ensina-nos assim uma coisa: é que a greve de massas nem é 'fabricada' artificialmente nem 'decidida' ou 'difundida' no éter imaterial e abstracto, é tão-somente um fenómeno histórico, resultante, em certo momento, de uma situação social a partir de uma necessidade histórica".

Sua preocupação residia em desenvolver uma ideia estratégica, sem se afastar do compromisso com a revolução socialista, contra a inércia burocrática do Partido Social-Democrata, procurando vincular a greve às exigências transformadoras da sociedade, num desafio global contra a ordem capitalista. "A 'revolução' e a 'greve de massas' são conceitos que não representam mais do que a forma exterior da luta de classes e só têm sentido e conteúdo quando respeitantes a situações políticas bem determinadas".

É durante esse período (1903 a 1906) que Rosa desenvolve sua teoria sobre democracia operária, movimento de massas, sempre preocupada em dar respostas concretas às necessidades da luta de classes e, fundamentalmente, da organização revolucionária do operariado. Também é nesse período que seus adversários recolhem informações para caracterizá-la como espontaneísta. Logo Rosa, que, a vida toda, foi uma pessoa organizada. Mas isso não a impediu de afirmar que: "a massa não é apenas objecto da acção revolucionária; é sobretudo sujeito".

Durante a sua militância, Rosa Luxemburgo dedicou também tempo ao estudo académico, em particular ao desenvolvimento do capitalismo. Segundo alguns pensadores socialistas é nesse período que produz sua mais importante contribuição teórica, em particular à teoria económica, "A Acumulação do Capital", datada de 1912, onde desenvolve suas ideias sobre as origens e crescimento do capital, relacionando-as com o desenvolvimento histórico do sistema capitalista. É bom que se diga que é nessa obra que Rosa, não só disseca o fenômeno da reprodução do capital, mas também desenvolve sua compreensão e posição sobre o estádio imperialista do capital. Em tese desenvolve um amplo combate às posições revisionistas e adaptadas de teóricos ditos de esquerda, mas que empurravam a classe operária para os braços da burguesia.

Durante a primeira guerra mundial, Rosa Luxemburgo liderou as posições contrárias ao envolvimento da classe trabalhadora nesse conflito, esclarecendo seu caráter imperialista e, portanto, negando qualquer participação operária nessa guerra do capital. Quando em 4 de agosto de 1914 a bancada do Partido Social-Democrata (seu partido) votou a favor dos créditos de guerra, Rosa Luxemburgo disparou uma bateria de ataques à direção do partido que culminou com a publicação do texto "A Crise da Social-Democracia", também conhecido como "O Folheto Junius", publicado em 1915, no qual faz a seguinte afirmação sobre a guerra: "A demência não terá fim, o sangrento pesadelo do inferno não vai parar até que os operários da Alemanha, da França, da Rússia e da Inglaterra despertem de sua embriaguez, apertem fraternalmente as mãos e afoguem o coro brutal dos agitadores belicistas e o grito das hienas capitalistas no poderoso grito do trabalho – “Proletários de todo o mundo, uni-vos!"

No período em que esteve presa, Rosa Luxemburgo escreve, entre outros textos, o importante documento sobre a Revolução Russa de 1917. Além de esclarecer de uma vez por todas as convergências e divergências com as posições de Lênin, "A Revolução Russa", redigido no verão de 1918, constitui-se numa das principais obras sobre o socialismo no mundo. Enaltece a iniciativa revolucionária dos bolcheviques e destaca a importância da Revolução Russa no cenário internacional, mantendo, porém, sua concepção crítica sobre a violência revolucionária e a defesa da democracia proletária.

Mesmo presa, Rosa Luxemburgo não deixou da fazer política, seu núcleo de esquerda, do qual participavam entre outros Karl Liebknecht, continuou organizado dentro do Partido Social-democrata, até ser expulso; a bem da verdade, actuava com programa próprio (redigido por Rosa, em Janeiro de 1916) conhecido como "Princípios Directores" ou "Directivas". Esse núcleo foi historicamente conhecido como "Liga Spartacus". Em 1917 o Partido Social-democrata expulsou não só os espartaquistas como também um grande grupo de oposição. Esse grupo, do qual participa a Liga Spartacus, dá origem ao "Partido Social-Democrata Independente". Registre-se que a Liga se manteve organizada no novo PSDI, conservando sua organização e sua política.

Os espartaquistas permaneceram no PSDI até que este decidiu participar no governo. Em 29 de dezembro de 1918 a Liga decide fundar o Partido Comunista Alemão. É bom que se diga que a Alemanha vivia um autêntico período revolucionário (particularmente em Novembro e Dezembro de 1918 e Janeiro de 1919), com amplas greves, motins na marinha de guerra, soldados confraternizando com o Exército Russo, com insurreições operárias.

As autoridades mostravam-se impotentes para enfrentar as rebeliões; os conselhos de operários e soldados cresciam e fortaleciam-se. Em contraposição, o Partido Social-Democrata defendia desesperadamente a convocação da Assembleia Constituinte, numa clara posição em favor da ordem capitalista.

Por força do movimento social, que a cada momento "ganhava" as ruas, Rosa Luxemburgo é posta em liberdade em Novembro de 1918; sai da cadeia para reforçar a luta pela revolução socialista. Ao lado de Karl Liebknecht, aposta cada vez mais no movimento de massas, na greve de massa, dirigindo todas ações do então criado Partido Comunista Alemão. Postou-se claramente em defesa dos conselhos operários e soldados. Fortalecendo-os, dotando-os de destacado papel político na construção do poder revolucionário dos trabalhadores.

Enquanto socialista, Rosa Luxemburgo sabia mais do que ninguém que o futuro nos reservaria ou "socialismo ou barbárie".

Em 15 de Janeiro de 1919 Rosa Luxemburgo foi brutalmente retirada, juntamente com o companheiro Karl Liebknecht, do "aparelho" em que se mantinha clandestina e assassinada covardemente por paramilitares -reconhecidamente a serviço do governo social-democrata alemão. Um tiro levou sua vida, desapareceram com seu corpo, mas nunca conseguiram ofuscar a grandeza de suas ideias. Rosa vive entre nós!

Envelhecimento activo: armadilhas de uma ideologia (II)

Quando dantes se baixava a idade da reforma e se promovia a inactividade dos mais velhos, isso era justificado pela ideologia da terceira idade.

As novas políticas de aumento da idade da reforma encontram o seu alento numa nova ideologia: o envelhecimento activo.

A ideia de envelhecimento activo já é relativamente antiga. Uma das suas primeiras formulações aparece com os Panteras Cinzentas, que lutavam contra as discriminações de que eram vítimas as pessoas mais velhas.

Este movimento, que se desenvolveu nos Estados Unidos, durante os anos 1970, em paralelo com os movimentos de contestação à guerra do Vietname e à exclusão racial, defendia uma nova atitude, uma nova cultura para superar a exclusão, o isolamento e o paternalismo de que os idosos são vítimas.

Decalcando o lema dos Panteras Negras, segundo o qual "black is beautiful", os Panteras Cinzentas defendiam que "old is beautiful" e, em consequência, assumiam a idade, as rugas e os cabelos brancos como traços distintivos de que se orgulhavam.

E afirmavam "não queremos mais mitos, não queremos mentir sobre a nossa idade". Ao mesmo tempo, criaram organizações de solidariedade autónomas e denunciavam todas as formas de descriminação com base na idade, incluindo a reforma obrigatória.

O ciclo do envelhecimento individual, fisiológico e psíquico, é condicionado por factores genéticos e por factores sociais.

Ao longo do ciclo de vida, os comportamentos individuais pesam de maneira positiva ou negativa sobre a saúde e, por conseguinte, sobre a marcha do envelhecimento: os cuidados com o corpo, a higiene individual, os comportamentos alimentares, o uso de estupefacientes, de álcool, os lazeres e a actividade física, a violência familiar, os comportamentos sexuais, a vida familiar, a actividade profissional e os contextos de trabalho, o habitat e os transportes, as sociabilidades e redes de amigos, etc.

As atitudes face à saúde são condicionadas socialmente e culturalmente e as estratégias de sobrevivência dependem dos recursos que cada indivíduo obtém no seu meio social, familiar e profissional, mas também da sua capacidade para saber agir e da acessibilidade aos serviços de saúde.

Em sociedades que já são envelhecidas como a portuguesa e que o serão cada vez mais no futuro, a qualidade do estado de saúde à beira e acima dos 50 anos é uma variável socialmente, politicamente e economicamente estratégica.

Apesar do aumento da longevidade, as nossas sociedades são elas próprias cada vez mais produtoras de patologias.

No espaço de 30 anos, verificou-se um agravamento dos constrangimentos e da penosidade do trabalho, o que contribui para reduzir a produtividade dos seniores, aumentar o seu absentismo e os riscos de perda de emprego e a incitá-los a deixar o mercado de trabalho o mais depressa possível.

As actuais políticas de aumento da idade da reforma que se baseiam no aumento da longevidade têm esquecido um dado importante: a segurança social e o sistema de reformas só são viáveis se for preservada a saúde dos seniores nos seus lugares de trabalho.

O agravar do desemprego e da precariedade demonstram que as novas políticas das reformas por velhice baseadas na ideia de envelhecimento activo constituem uma fraude, uma armadilha para todos quantos trabalham e têm a legítima aspiração e o direito de usufruirem de uma reforma digna ao fim de muitos anos de trabalho.

Porque o envelhecimento activo deve ser preparado ao longo da vida, devemos repensar o actual modelo de ciclo de vida, que descrimina os não-activos.

Trabalho para todos, formação para todos, lazeres para todos, ao longo da vida. É o princípio da despecialização das idades e das gerações, que o antigo primeiro-ministro francês Michel Rocard tentou implementar e que foi parcialmente posto em prática pela ministra do Governo de Lionel Jospin, Martine Aubry com a aprovação da lei das 35 horas semanais.

Em relação às políticas relativas ao envelhecimento individual, entrámos num ciclo marcado pelo retrocesso social.

Mas este retrocesso pode ser superado com vista ao futuro, por forma a que não aumente a precariedade e a pobreza dos inactivos e para que sejam universalmente assegurados os principais direitos sem os quais não existe plena cidadania sénior: o direito ao trabalho, o direito ao lazer e à cultura, o direito a uma reforma digna e o direito à protecção contra discriminações e violências.

Existem alternativas que viabilizem reformas dignas para os não activos do futuro, alternativas que implicam a redução e a partilha dos tempos de trabalho, em conjunto com a partilha dos tempos de formação e de lazer ao longo da vida. São estas as alternativas que viabilizam a concretização socialmente generosa do envelhecimento activo para todos.

Concretização socialmente generosa, que é também economicamente indispensável. Porque uma sociedade que fomenta o pleno emprego e aproveita a energia, a inteligência e a experiência de trabalhadores mais velhos é certamente uma sociedade mais rica e mais equilibrada.

Mas o envelhecimento activo não pode assentar numa ficção que é a de esperar que todos estejam disponíveis para trabalhar obrigatoriamente até aos 70 anos. Não pode assentar nessa uniformização social.

A penosidade do trabalho e o estado de saúde são os principais factores sociais que diferenciam a capacidade de cada um para prosseguir uma actividade profissional. Por isso, devem ser considerados factores de ponderação em relação às modalidades de atribuição de uma pensão de reforma e à idade para cada um cessar a sua actividade.

Do mesmo modo, não podem ser fixados limites obrigatórios para cessação de actividade, porque a idade não pode ser um factor de descriminação no mercado do trabalho.

A ideia de envelhecimento activo, ao contrário do que impõem as leis vigentes, é totalmente compatível com o exercício do direito ao trabalho qualquer que seja a idade. Mas isso implica também que, uma vez esgotada a duração razoável do tempo de trabalho exigível para se obter a pensão de reforma, quem optar voluntariamente por uma 2ª carreira ou por prestar serviços à comunidade ou à família, essa actividade deverá ser regida por contrato que preveja a duração e as condições de trabalho, assim como a respectiva remuneração.

O envelhecimento activo pressupõe uma cultura da idade que defenda o direito ao trabalho qualquer que ela seja.

É o que acontece nos países nórdicos, onde se promove o emprego depois dos 45 anos. Mas na maioria dos países, a idade tornou-se um critério legal de dispensa do trabalho, portanto de descriminação, que deprecia os trabalhadores mais velhos. A idade é o principal factor de discriminação face ao trabalho em muitos países europeus.

As discriminações baseadas na idade têm a sua origem no mercado do trabalho. Quem de lá saiu já deu o que tinha a dar. Além de se considerar que já não tem utilidade, o reformado é visto como alguém que custa dinheiro aos contribuintes activos. Um peso para a sociedade.

Recentemente, um grupo de investigadores franceses que trabalham sobre o envelhecimento e a velhice apresentou à Alta Autoridade de luta contra as discriminações e pela igualdade um protesto contra práticas discriminatórias baseadas na idade.

Denunciaram, em primeiro lugar, o facto de em inquéritos oficiais se excluírem os idosos, dando como exemplo um inquérito sobre a sexualidade que não interrogou quem tivesse mais de 70 anos e outro sobre as violências contra pessoas, que não incluiu quem tivesse mais de 60. Ambos os inquéritos foram realizados pelo Instituto Nacional de Estudos Demográficos e os resultados publicados em 2007.

Outros exemplos de discriminações baseadas na idade: a partir dos 45 anos, além de ser mais difícil arranjar um emprego é também difícil aceder à formação contínua; nas urgências dos hospitais, as pessoas mais velhas têm que esperar mais tempo para ser atendidas; na vida quotidiana, os mais velhos são desconsiderados ou mesmo maltratados em lugares públicos. Os investigadores franceses decidiram criar em 2008 um observatório das discriminações contra os idosos.

Mas a principal descriminação e muitas vezes fonte de violências contra os mais velhos é a pobreza.

É nas classes baixas que as condições de vida dos reformados são mais penosas. Ao baixo poder de compra, às más condições de habitação, baixa qualidade da alimentação e problemas de saúde, acrescem muitas vezes o isolamento e a marginalização social.

Também a condição social das mulheres idosas pode ser particularmente traumática e difícil.

Em relação aos homens da mesma idade, as mulheres idosas são mais susceptíveis de sofrer perdas económicas e socio-emocionais.

Visto que têm tendência para desposar homens mais velhos e de terem uma longevidade maior, as probabilidades de serem viúvas são muito elevadas. A longevidade das mulheres pode-se, pois, transformar numa desvantagem, nomeadamente porque, sendo a probabilidade de ficarem sózinhas mais elevada, elas são mais susceptíveis do que os homens de serem colocadas numa instituição.

Muitos idosos, na sua maioria mulheres, vivem em situações desesperadas. É o que mostram, por exemplo, os indicadores relativos à pobreza em Portugal. Assim, segundo o Inquérito aos Orçamentos Familiares do INE, de 2000:
-entre os idosos com 65 e + anos – que representavam então 15,4% da população – 27,1% estavam entre os 10% mais pobres;
-o índice de pobreza dos idosos sós era o mais elevado de todos (50%), vindo a seguir o das famílias só com idosos (33%).

Não será a nova política do envelhecimento dito “activo” que resolverá os dramas sociais da velhice.

Parafraseando alguém, cujo nome esqueci, para sofrimento deveria bastar ser-se velho.

Mário Leston Bandeira

http://a-bela-moleira.blogspot.com/
Foto: DR

É preciso um candidato de esquerda... há por aí alguém disponível?

Manuel Alegre é o candidato do partido do governo e também da direcção do Bloco de Esquerda. Fernando Nobre, assumido como uma "iniciativa cidadã" que não é de direita nem de esquerda, é a candidatura "marca branca" ...

No dia 22 deste mês, participei numa reunião de activistas de diversas esquerdas que estão preocupados com o estado a que as esquerdas chegaram quanto às próximas presidenciais.

Os activistas das esquerdas - de diversos partidos, de diversas associações, individualmente - manifestaram preocupação por esta espécie de "nível zero" a que as esquerdas chegaram. Um "nível zero" que se resume no seguinte:

os candidatos ditos de esquerda movimentam-se na área do partido do governo e avançam com propostas que pouco ou nada se diferenciam do presumível candidato da direita, o actual Presidente;

de um momento para o outro, as esquerdas sentem dificuldade em identificarem um candidato comprometido com propostas anti-capitalistas, democráticas e socialistas, e, pior ainda, sentem que hipotéticos nomes identificados com uma candidatura das esquerda que o são, aceitem o desafio;

o voto útil numa primeira volta das Presidenciais não faz sentido. Mas a luta contra a direita numas Presidenciais fica sempre refém da existência de uma 2ª volta e, nessa 2ª volta, lá estará novamente o tal voto útil nos candidatos que só são de esquerda, no momento das campanhas eleitorais.

Há um imenso espaço social à esquerda e de cidadãos revoltados com os efeitos desta crise que não se revêm nas actuais candidaturas presidenciais.

Nesse espaço social, cresce alguma angústia pela incapacidade prática e concreta de se apresentar alguém com o prestigio e a notoriedade políticas e sociais suficientes para a reafirmação dos valores, principios e propostas das esquerdas de afirmação democrática, socialista e anti-capitalista.

Os principais partidos das esquerdas com representação parlamentar têm uma responsabilidade notória no estado a que se chegou. Mas as esquerdas extra-parlamentares parece que só se lembraram de influenciar alguma coisa, tarde e a más horas!...

O parlamentarismo dito de esquerda e algum esquerdismo que continua a pulular entre as esquerdas extra-parlamentares, juntaram-se objectivamente criando uma situação política perfeitamente aberrante e de consequências negativas.

É incompreensível que a onda de protesto social e laboral existente em Portugal e por essa Europa, não tenha nenhuma repercussão política no aparecimento de uma candidatura alternativa às do situacionismo governamental e parlamentar.

Na minha opinião, o tempo para a apresentação de uma candidatura das esquerdas, socialistas, democráticas e anti-capitalistas escasseia a um ritmo intenso! Ou seja, não há muito tempo ... mas ainda sobra algum!

Como militante do Bloco de Esquerda que participou na última Convenção Nacional e apelou, com mais 305 bloquistas, a uma Convenção Extraordinária que discutisse democráticamente a decisão a tomar quanto a uma candidatura presidencial, assumo que seria muito importante e mobilizador que fosse possível a apresentação de uma candidatura de afirmação alternativa às que já surgiram e surgirão, formalmente situadas à esquerda.

O Bloco de Esquerda é uma referência política alternativa na esquerda socialista que conseguiu a convergência de correntes com experiências politico-ideológicas muito diferentes à esquerda. Conseguiu também um impacto social e eleitoral notável. Mas, com o passar dos anos e o sucesso eleitoral, parece que uma das principais mensagens fundacionais - correr por fora ... estar com e nos movimentos e as lutas sociais ... - se foi esquecendo! E o cúmulo desse esquecimento é a partilha de uma mesma candidatura presidencial com o partido do Eng. José Sócrates!

Estou convencido que muitos bloquistas, muitos eleitores que votam Bloco de Esquerda, muita gente que via novidade e coragem políticas na postura do BE, não compreendem, não aceitam a escolha do candidato Manuel Alegre pela direcção política bloquista!

Essas pessoas esperavam que o Bloco de Esquerda fosse, mais uma vez, referência de esquerda de confiança, energia alternativa, na escolha de um candidato que agora soubesse incorporar o protesto social que cresce contra as falsas soluções para a crise impostas pelos governos europeus, como o de José Sócrates, às ordens da Europa de Durão Barroso.

Por respeito às expectativas dessas pessoas, por referência aos principios fundacionais do Bloco de Esquerda, por não querer contemporizar com políticas neo-liberais, estou comprometido com a busca activa de uma candidatura das esquerdas democrática, socialista e anti-capitalista que saiba dar voz ao protesto social!

O tempo não ajuda, é um facto!

Mas no movimento e no protesto sociais ficarão a saber que, contra a corrente do conformismo das esquerdas parlamentares, buscou-se, tentou-se!

João Pedro Freire

http://militantesocialista.blogspot.com/
Foto: DR

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Algumas notas...

...a propósito do tema do envelhecimento, da reforma e da “sustentabilidade da Segurança Social (SS)”,
lançado pelo Leston Bandeira*

O objectivo da mafia socratóide e dos seus congéneres europeus, com o alargamento da idade da reforma, é duplo. Um, é aumentar o tempo de trabalho e de descontos, com benefícios óbvios para o lucro dos patrões e para a receita da SS; o outro, é reduzir o tempo de vida com pensão de reforma com a inerente redução de custo para a SS. Isto é, pretende-se aumentar a “rendabilidade sistémica” de cada trabalhador enquanto beneficiário da SS; e aumentar o seu contributo social, engordando o capitalista.

Os sistemas de SS nasceram no tempo da mão de obra intensiva, e de uma, comparativamente baixa incorporação de capital no produto, pelo que a relação entre a massa salarial e o volume da produção era bem mais elevada que hoje. Com a intensificação da incorporação de capital no processo produtivo e, sobretudo, com o enorme crescimento do valor introduzido pelo trabalho humano (qualificações), a produtividade aumentou muito e isso não se reflectiu totalmente nos níveis saláriais.

Daí que existam muitas empresas com reduzido volume de trabalhadores e enorme stock de capital e/ou volume de vendas cujo contributo para a SS é baixo, comparativamente ao de outra empresa com igual volume de vendas mas muitos mais trabalhadores. Que ninguém se admire, por estas e outras razões, que os capitais prefiram reproduzir-se onde a incorporação de trabalho seja menor - especulação, imobiliário, sector financeiro, intermediarismos vários…

É conhecido que uma das formas de melhorar o desempenho da SS passa por onerar o volume de vendas das empresas ou o valor do seu imobilizado, como forma de compensar o enorme crescimento do trabalho não pago incorporado no valor dos bens e serviços produzidos, nomeadamente nas empresas que têm pouca mão de obra.
(ver desenvolvimento em: http://esquerda_desalinhada.blogs.sapo.pt/6897.html e http://esquerda_desalinhada.blogs.sapo.pt/7124.html)

O problema da SS portuguesa não é tanto o aumento de custos relacionado com a maior longevidade. Por exemplo, o custo dos subsídios de doença está estagnado há muitos anos. Há um subfinanciamento crónico com várias origens:

A desregulação dos vínculos laborais permite que muito trabalho efectivamente prestado seja remunerado com a entrega, pela empresa, de carro ao assalariado, com o usufruto de cartões de crédito, férias, seguros etc. Com esse esquema legalizado há muito pelo PS/PSD, a empresa não fornece a parcela correspondente para a SS; o trabalhador fica com o rendimento para IRS mais baixo e odesconto para a SS anulado nessa fatia objectiva do seu salário pago em espécie. Só mais tarde pensará que tudo isso terá reflexos no nível da pensão de reforma mas, entretanto tem carrinho “de borla”(?)

Um carro de gama média com combustível, seguros, etc não custa a uma empresa menos de €500/mês ou 6000/ano; isto é aproximadamente € 2100/ano que a SS não recebe por cada trabalhador com popó. E são muitos.

A dívida das empresas que não pagam à SS é enorme e cresce todos os anos enormemente:

“De acordo com a Conta da Segurança Social incluída nos relatórios das Contas do Estado, extraem-se os valores seguintes com os quais se podem construir relações muito instrutivas:

O saldo bruto das contas com saldo devedor de cobrança problemática cresceu em 2008, 48.5%, revelando, por um lado, a continuidade da prática tradicional dos dignos empresários lusos utilizarem o dinheiro dos trabalhadores como financiador das suas actividades, como substituto fácil do auto-financiamento que não gostam de fazer ou do financiamento bancário, caro ou inacessível. Por outro lado, demonstra a tolerância e a conivência do gang governamental que procura ridiculamente mostrar sempre resultados na caça aos contribuintes relapsos, que a realidade desmente. Aquela dívida acumulada, em 2008, corresponderia a 1.87% do PIB e teria deixado, se cobrada, o deficit ficaria reduzido a uns poucos 0.3%.”
(http://www.scribd.com/doc/27972404/Capitalistas-e-Estado-A-Mesma-Luta)

No entanto, a propaganda não se cansa de afirmar que o governo recuperou muitos milhões; claro que nunca comparam o que recuperaram com a nova dívida que surgiu. E, entretanto lançaram recentemente o enésimo plano de recuperação de dívida…

Por outro lado, é de questionar a aplicação que se faz das reservas financeiras da SS, nomeadamente em títulos do tesouro e em títulos de empresas. Há dois anos, com o estoiro do BPN, a SS apanhou um susto pois tinha lá colocadas umas centenas de milhões de euros. Melhor seria que essas reservas fossem investidas em habitação social, com efeitos reprodutivos evidentes, utilidade social e factor de travão da especulação imobiliária.

Para finalizar uma evidência que a esquerda portuguesa ignora: a indevida integração da SS no conceito alargado de Estado, como se fosse autarquia, região autónoma, direcção-geral ou serviço autónomo.

A SS constitui o fundo de pensões e de apoio mútuo dos trabalhadores portugueses para várias eventualidades e que, para isso, descontam o valor das contribuições nos seus salários.

Os descontos para a SS são verbas consignadas a um fim específico e não podem ser considerados como rendimento genérico do Estado como acontece com os impostos, aplicáveis pelos governos, em submarinos, escolas, ou carrões para corruptos. Se assim fosse, o governo deveria incluir e dispor igualmente dos valores que os trabalhadores descontem para fundos de pensões privados.

Compete à esquerda lutar pela desconexão da SS da gestão do Estado, para evitar que as reservas financeiras dos trabalhadores para fazer face, nomeadamente, às eventualidades de aposentação e doença sejam desviadas, pelos gangs governamentais, para o financiamento do deficit criado pelo apoio aos banqueiros e às mota/engils, para dotar as empresas de competitividade (?) com a redução das taxas de descontos para a SS ou, para colocar quadros partidários acéfalos na gestão do dinheiro dos trabalhadores.

Veja-se este exemplo gritante de desvio de dinheiro da SS protagonizada por um tal Cavaco Silva:

“Mais, Cavaco, não cumpriu a lei de bases da segurança social, aprovada na AR pelo seu partido em 1984. E esse incumprimento (não transferência do OE de despesas não cobertas por contribuições) até 1995, descapitalizou a Segurança Social em 6017 M€, o equivalente às receitas de um ano (1993). Cavaco foi portanto um dos cabouqueiros que trabalharam para justificar o assalto de Sócrates aos bolsos dos trabalhadores e ex-trabalhadores”( ver o desenvolvimento em: http://esquerda_desalinhada.blogs.sapo.pt/7455.html)

Os regimes cleptocráticos têm destas coisas. Se alguém se locupletar a €1000 que lhe não pertencem, tem problemas com a justiça. Um governo inteiro, dá descaminho a mais de 6000 M e o seu chefe ainda chega a PR.

Vitor Lima
Foto: JJ LUZÍA HENRIQUES

Greve nacional em França contra o aumento da idade de reforma

Os trabalhadores franceses voltam hoje a manifestar-se contra as políticas neo-liberais dos governos da União Europeia. Hoje contestam o aumento da idade de reforma para os 62 anos.

Os planos de Sarkozy não são exclusivos para os franceses. Tal como os planos de Sócrates não são exclusivos para os portugueses. Em França, em Portugal, na Alemanha, na Grécia, em Espanha, em Itália, as políticas ditas de ataque à crise, têm, todas elas, a mesma matriz, a mesma orientação. São definidas por uma União Europeia que existe à margem da vontade democrática e da participação dos europeus.

As actuais politicas europeias e as suas ramificações nacionais, não são o único, nem sequer o caminho, para se combater uma crise que tem a sua origem na consequência de políticas neo-liberais e de ditadura do mercado impostas durante anos e anos.

Existem outros caminhos para se sair da crise! E por esses caminhos tem de passar a vontade democrática e a participação de todos os europeus. Os actuais governos europeus estão diáriamente a demonstrar a sua incapacidade para resolver o que quer que seja no interesse social dos europeus.

As esquerdas, principalmente aquelas que possuem uma perspectiva anti-capitalista e socialista, têm uma responsabilidade enorme! A responsabilidade de definirem uma alternativa política aceite por todo o movimento social e laboral europeu que tem protestado em cada espaço nacional. Mas têm também uma outra importante responsabilidade: incluirem nessa alternativa política de dimensão europeia, a refundação da Europa num sentido democrático e social, com a eleição democrática e universal de uma Constituinte europeia!

A existência de um espaço europeu único e de uma moeda única europeia é uma conquista que as esquerdas devem incorporar num programa de democracia, de pluralismo, de socialismo e de capacidade de definição de um outro modelo económico, onde as diversas formas de capitalismo sejam erradicadas e substituidas por um planeamento democrático de experiências de economia social, de acção cooperativa, de autogestão e até co-gestão em unidades económicas de grande dimensão.

Editado em TRIBUNA SOCIALISTA http://militantesocialista.blogspot.com/
Foto: DR

Os reais motivos da invasão do Iraque


http://antinatoportugal.wordpress.com/

Envelhecimento activo: armadilhas duma ideologia (I)

Dantes, a velhice inactiva era um período muito curto, em geral passado em família, ou em asilos/hospícios, à espera da morte.

A ideia de reforma por velhice era até à 2ª metade do século XX, completamente estranha à cultura operária. As primeiras caixas de reforma operária foram, aliás, instituídas, no final do séc. XIX, por chefes de empresa animados pelo “filantrópico” objectivo de reduzir os “custos de produção”, desfazendo-se dos velhos trabalhadores, que consideravam serem demasiado pagos para o rendimento que forneciam.

A “filantropia” patronal estimulava também a “poupança” que considerava um bom instrumento de moralização contra a vida desordenada dos operários. Quanto às mútuas operárias, elas destinavam-se a cobrir riscos mais importantes do que a velhice: o desemprego, a doenças, as greves.

Mas o direito à reforma será instituído mais tarde, sob pressão dos sindicatos operários. A consagração deste direito após a 2ª guerra (em Portugal, trinta anos mais tarde) respondeu principalmente às transformações inerentes à extensão do trabalho assalariado e às mudanças que afectavam as relações entre gerações na família.

Nessa fase, o reformado inactivo era predominantemente urbano e assalariado. Nas margens, ficavam os trabalhadores e pequenos proprietários rurais que resistiram ao êxodo rural e para quem as pequenas pensões que recebiam constituíam apenas um complemento ao rendimento familiar obtido a partir do trabalho da terra. Situações que, de algum modo ainda hoje se mantêm, mas agravadas pelo isolamento familiar no interior envelhecido.

A progressiva generalização do direito à reforma provocou o aparecimento da ideologia da 3ª idade, a qual veio consagrar a idade da reforma como uma categoria social não autónoma de pessoas inactivas e dependentes que precisavam de cuidados que só podem ser providenciados por especialistas.

Ao mesmo tempo, a gestão política da velhice foi-se subordinando cada vez mais à pressão imposta pela necessidade de se criarem empregos para os jovens, o que incentivou a competição entre gerações no mercado do trabalho.

Daqui resultaram várias consequências:

1 - O direito ao trabalho passa a ser condicionado pela idade, incluindo a imposição de limites etários para além dos quais não é permitido continuar a exercer uma profissão (é a reforma-guilhotina.

2 - Governos e empresas aliam-se tacitamente com o objectivo de acelerar a antecipação da cessação da actividade profissional depois dos 50 anos (pré-reformas.

3 - A lógica de evicção dos trabalhadores seniores sobrepõe-se à lógica da sua integração social e aumenta a perda de autonomia e a marginalização social desses trabalhadores condenados à inactividade.

4 - O direito à pensão de reforma é, assim, transformado em interdição de trabalho e o direito ao repouso em lazer forçado.

A queda da natalidade, o envelhecimento demográfico e o aumento da longevidade têm servido para justificar novas políticas que invocam os problemas da sustentabilidade da segurança social e, agora com os PEC´s, da sustentabilidade da economia, ponto final.

Os argumentos demográficos foram utilizados por José Sócrates para justificar, no dia 27 de Abril de 2006, perante a AR a decisão de “ligar as pensões de reforma à evolução da esperança de vida”, com a finalidade de se assegurar a sustentabilidade da segurança social.

Apesar de afirmar no mesmo discurso que o governo não aumentará a idade legal de reforma, na prática foram introduzidas condicionantes que colocam os futuros reformados entre a espada e a parede:
- ou trabalham mais tempo;
- ou reforçam as suas contribuições ao longo da vida activa.

Explicou então o primeiro-ministro que o “crescimento das despesas com pensões é o que mais seriamente questiona a sustentabilidade do modelo social e é sabido que ele deriva, fundamentalmente, do aumento da esperança de vida, ou seja, do número cada vez maior de anos em que se está a receber pensão”, Por outro lado, “há cada vez menos pessoas a trabalhar para garantir o pagamento dessas reformas”.

É verdade que há cada vez menos pessoas a trabalhar para garantir o pagamento das reformas, mas isso não tem a ver com a baixa natalidade. Tem a ver com o desemprego e a precariedade que rege o mercado do trabalho.

Teoricamente, porque há menos jovens e, por conseguinte, menos concorrência, deveria haver mais e melhores oportunidades de emprego. Ora não é isso que está a acontecer.

Não são apenas os jovens que têm cada vez mais dificuldade em arranjar emprego, um emprego que corresponda às suas qualificações, com estabilidade e com direitos plenos. Também os mais velhos são cada vez mais obrigados a sair precocemente do mercado do trabalho, caindo em situações de extrema precariedade.

De facto, o envelhecimento dos activos começa na base, com a entrada tardia dos jovens na vida activa e acentua-se com a saída compulsiva de trabalhadores na força da idade. Para muitos deles, o envelhecimento profissional começa a perfilar-se logo a seguir aos 45 anos, ou seja, quando começa a 2ª parte de qualquer carreira profissional. Em 2007, a taxa de emprego entre 55 e 64 anos na UE era 44,7%.

Nestas condições, como escapar à espada das alternativas que o governo coloca a todos quantos aspiram a uma reforma digna após uma vida de trabalho?

Consideremos o exemplo de alguém que conseguiu um contrato de trabalho aos 30 anos e ficou desempregado aos 50, o que significa 20 anos de descontos, Quais são as alternativas, segundo o modelo socrático, deste candidato à reforma para obter uma pensão digna?

Alternativa nº 1: trabalhar mais anos, ou seja, arranjar um novo emprego que dure até, pelo menos, aos 70 anos.

Alternativa nº 2: reforçar os descontos para a reforma.

Viabilidade das alternativas:

Alternativa nº1: provavelmente zero.

Alternativa nº 2: depois de pagar a prestação da casa, depois de pagar a educação dos filhos, o que é que sobra para as prestações da reforma?

O novo contexto demográfico é apenas um álibi político.

Parafraseando um político americano, apetece dizer: não é a demografia, estúpido, é a política, é a economia, é o social.

Mário Leston Bandeira

http://a-bela-moleira.blogspot.com/

Foto: DR

A esquerda anticapitalista não se rende!

ASSEMBLEIA DE ACTIVISTAS
POR UMA CANDIDATURA PRESIDENCIAL DE ESQUERDA

10 de Julho, Sábado, Lisboa, Palco Oriental
(Calçada Duque de Lafões, nº78)

A Assembleia inicia os seus trabalhos a partir das 10h00, prolongando-os até às 18h00.

Entre as 13h00 e as 14h30 será efectuado um intervalo para almoço, que ocorrerá num restaurante próximo (o preço por refeição não deverá exceder os €8,00).

A ordem de trabalhos será decidida no início da Assembleia, altura em que se procederá à eleição da mesa.

A Assembleia é aberta a todos os activistas de Esquerda que se revejam na necessidade de um candidatura para levar o protesto social às presidenciais.

Confirmações de presença para o e-mail: mailto:esquerda2011@gmail.com ou para o telemóvel: 915 229 504.

Textos de opinião, sugestões e propostas deverão, de igual modo, ser encaminhadas para o e-mail em referência.

Transportes
Autocarros 28, 39, 718, 793

terça-feira, 22 de junho de 2010

Euro e soberania, comentário a dois comentários*

Saúdo os comentários de Nuno Cardoso da Silva e de João Pedro Freire à Proposta de Linhas Programáticas para uma candidatura de Esquerda às presidenciais, que apresentei.

A discutir é que a gente se entende, e hoje, mais do que nunca, discutir é preciso.

Há uma certa convergência entre os dois comentários não apenas pelas opiniões, mas principalmente pelos temas e, por isso, permito-me responder-lhes em conjunto de uma maneira sintética, dentro do possível. Os pormenores ficarão para mais tarde.

Há aqui duas questões estreitamente ligadas: a do euro e a da soberania. Comecemos pela segunda.

Concordo que o conceito de soberania pode ter más conotações. Por um lado, a soberania dum Estado tende sempre a ser condicionada e, por isso, ela é relativizável porque a independência dum país pode ser mais ou menos dependente de interesses e de poderes terceiros. Pode também acontecer que ela seja apenas a expressão de nacionalismos serôdios e exacerbados. Foi o que aconteceu na Europa entre as duas guerras. Em Portugal, o Estado Novo era um Estado soberano e o seu nacionalismo exacerbado e beato servia apenas para legitimar a ditadura. Era um Estado anti-social e anti-democrático que não tolerava as liberdades individuais.

Na mesma época, outros Estados soberanos assumiam os valores da democracia, eram sociais e as liberdades individuais estavam plenamente consagradas. Constituíam o exemplo paradigmático da relação que legitimamente se pode estabelecer entre soberania, liberdades e democracia.

Poderá esse paradigma ideal aplicar-se ao actual Estado português?

Penso que esse modelo deixou de fazer sentido entre nós. O que está a acontecer ou já aconteceu – as coisas mudam depressa demais lá nos segredos dos bastidores dos mandões da EU – é um golpe de estado, cujas consequências me parecem óbvias: se os órgãos de soberania democraticamente eleitos em Portugal deixaram de ter competência para aprovar o orçamento e votar impostos, isso significa o quê? Significa que a soberania desses órgãos passou a ser de fachada e que Portugal já não é um país soberano.

Será esta conclusão uma ilação nacionalista, estilo Estado Novo? Não, porque o que sobreleva aqui em relação ao conceito de soberania é a perda das liberdades e da democracia políticas.

Se Portugal já não é um país soberano, o que é que isso quer dizer? Quer dizer que a democracia portuguesa passou a ser uma democracia de fachada, já não mandamos em nossa casa.

Síntese: se não gostamos da palavra soberania, então falemos de liberdade e de democracia.

Chegamos, então, ao ponto: soberania democrática/EU/euro/PEC/austeridade são questões indissociáveis, temos que nos pronunciar sobre elas todas e não apenas sobre esta ou aquela.

Falemos da União Europeia. Será exagerado compará-la com a defunta União Soviética?
Ambas foram constituídas de cima para baixo. Haverá algum português que se possa gabar de ter tido a oportunidade de se pronunciar, de ter votado em relação à entrada de Portugal na CEE, de ter votado a entrada no euro, de ter votado o Tratado de Lisboa? O que foi feito das promessas?

Do mesmo modo que não existia uma URSS aceite por todos os povos que nela estavam integrados à força, sob a mão férrea do partido comunista soviético e da sua nomenklatura, também não existe uma União Europeia decidida e construída livremente pelos povos europeus.

Queremos os Estados Unidos Socialistas da Europa de que fala o João Pedro Freire? Generosa ideia. Não rejeitemos as utopias, mas sejamos humildes e realistas. Desconfiemos dos burocratas que odeiam a democracia. Eles construíram a União Soviética. Outros parecidos com eles mandam na UE, ou seja, mandam em nós e ninguém diz nada.

Porquê? Porque o que está agora na moda é dizer que isso do Estado-Nação passou a ideia arqueológica. E dizem-nos isso a nós, o mais antigo Estado-Nação da Europa?

Sair do euro é um disparate, diz o Nuno Cardoso da Silva. E entrar, não foi? Há diferentes opiniões.

O economista francês Elie Cohen, por exemplo, afirma que o euro beneficiou sobretudo as economias mais desenvolvidas do Norte. E a razão compreende-se facilmente: por um lado, o euro ajudou a fixar a “especialização” dos países do Sul em sectores de baixas qualificações e de baixas rentabilidades; pelo contrário, com o euro, os países do Norte aproveitaram para “ocupar” os sectores mais performantes e tecnologicamente mais evoluídos. Quando rebentou a bolha do imobiliário e da construção civil, o que é que aconteceu à Espanha e a Portugal? A Espanha, que era o tigre ibérico, está à beira do abismo. Portugal? Portugal depende da Espanha.

Ganhámos assim tanto com o euro?

A questão do euro não é apenas económica e, mesmo que o fosse, o económico é, em primeiro lugar político, e também, ou talvez por isso, ideológico. O Neo-liberalismo, responsável por tantos crimes e miséria, não é uma ideologia? É tanto ou mais ideologia do que a economia “socialista soviética” centralizada. É a economia uma ciência absolutamente exacta? Não, não é.

É verdade que, entre as causas da falta de produtividade da economia portuguesa, estão a “falta de qualificação dos empresários, a falta de qualificação de muitos quadros médios e superiores e a falta de investimento por parte das empresas, que preferem distribuir dividendos” - estou a citar o Nuno Cardoso da Silva. Mas quem é que tem protegido e promovido essa gente? E a corrupção não tem nada a ver com isso?

Então, o que é que fazemos?

Espero que sejamos cada vez mais críticos, que mantenhamos o nosso espírito alerta, que confiemos na razão e no raciocínio, e que sejamos prudentes e realistas.

Falei de sair da EU e/ou do euro, é verdade, mas trata-se apenas de uma hipótese de trabalho, hipótese que se me afigura necessária face ao imbróglio para que fomos arrastados pelos responsáveis conhecidos de toda a gente. Trata-se de um cenário que é preciso equacionar e discutir, aprofundar.

É óbvio que se tal hipótese se viesse, se vier a concretizar-se, se trataria, se tratará de uma mudança cheia de consequências. Mas significa isso que devemos ficar caladinhos, à espera que os senhores de Bruxelas e os seus patrões tomem decisões por nós? Será que não nos compete, enquanto militantes de Esquerda sem complexos, atentos às realidades e virados para o futuro, colocar em cima da mesa todos os cenários?

Porque o que está em causa aqui em tudo o que tem a ver com a mais que problemática relação que Portugal tem com a União Europeia, é decidirmos se vamos ter coragem e lucidez, se seremos capazes de apostar em nos governarmos a nós próprios ou se, pelo contrário, vamos continuar a fazer gala em querermos ser bons discípulos e obedientes às ordens desses tipos que nos governam a partir de Bruxelas. E que, por que não foram eleitos por ninguém, não passam duns ditadorzecos.

Vamos tratar da nossa vida?

Vamos, por exemplo, encontrar novos parceiros internacionais? O que é que nos impede? A fidelidade a uma Europa que sempre nos olhou por cima do ombro? Há outros parceiros à nossa espera, temos é que os procurar.

Magrebe, África Subsaariana, América Latina. Foi por aí que nós andámos desde há muitos anos, quando éramos já uma espécie de párias, plantados aqui no extremo ocidental esquecido da Europa. Um extremo europeu periférico, sem rotas de comércio, estávamos condenados, como hoje. Mas descobrimos novos mundos, se calhar é essa a nossa sina.

E mandemos o Sócrates e o Cavaco para o espaço a bordo duma Soyuz. Declaro-me desde já contribuinte voluntário numa subscrição com esse propósito. Boa viagem.

Mário Leston Bandeira

*A resposta de MLB refere-se a estes comentários:
https://www.blogger.com/comment.g?blogID=6252602&postID=5641062074011470878

Publicado em ESQUERDA 2011 http://esquerda2011.blogspot.com/

Foto: DR

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Mais um crime de abuso policial, desta vez na Amadora

“Às 4:55 horas da madrugada de domingo 14 de Junho, no Parque Central da Amadora, um grupo de jovens, entre os quais Jakilson Pereira, 26 anos, licenciado em Educação Social, desempregado e candidato a bolsa de investigação, dirigiam-se para a Mina, Amadora.

Jakilson, que também é rapper e é mais conhecido como Hezbollah, agachou-se para apertar os atacadores dos ténis. De repente sentiu um automóvel aproximar-se dele. Levantou a cabeça e viu um homem com uma arma apontada na sua direcção que gritou “Caralho!” Assustado, Hezbollah correu na direcção do seu amigo Flávio Almada, 27 anos, estudante finalista do curso de Tradução da Universidade Lusófona, também rapper e mais conhecido como LBC, mediador sociocultural na Escola Intercultural das Profissões e do Desporto da Reboleira e formador musical de jovens inseridos no Projecto Escolhas do Moinho da Juventude e da Comissão de Moradores da Cova da Moura. LBC disse ao agressor: “Ele está desarmado!”, referindo-se ao seu amigo Hezbollah. Nesse momento, o homem disparou um tiro na direcção de Hezbollah. O homem estava fardado, era da PSP e tinha sido transportado para o local por um automóvel da PSP.

Hezbollah continuou a fugir e foi esconder-se por trás de um automóvel junto à Estação dos Correios, observando a progressão do agente da PSP que o procura de arma na mão. O agente detecta-o e corre na sua direcção. Sai outro agente do automóvel e ambos cercam Hezbollah. Agarrando-o sob ameaça da arma, começaram a pontapeá-lo. Chega um automóvel Volkswagen Golf preto, com dois polícias à paisana. Enquanto um dos agentes fardados algema Hezbollah, obrigando-o a deitar-se de barriga no chão, o outro polícia fardado volta a dar-lhe pontapés. Um dos agentes à paisana exclama: “Deixa o rapaz!”

Entretanto LBC tinha-se aproximado para tentar socorrer o amigo. Os polícias fardados agarram-no, deitam-no ao chão e algemam-no, pontapeiam-no e depois metem-lhe um pé sobre a cabeça e tiram-lhe a carteira e o telemóvel.

Levam-nos – cada um dos detidos no seu automóvel – para a Esquadra da Mina, na Avenida Movimento das Forças Armadas 14. Aí aparece o agente Monteiro e pergunta a Hezbollah, agarrado pelos braços por dois outros agentes para o manterem sentado numa cadeira: “Estás preparado?” e começa a dar-lhe socos e joelhadas na barriga. Hezbollah vomitou em consequência dos dois primeiros socos. LBC também é sovado. Um dos agentes comenta a certa altura: “Aqui estão os dois gajos. Qual de vocês é que tem um caso com a polícia?” Hezzbollah foi absolvido há cerca de um mês da acusação de ter partido dois dedos a um polícia, quando na realidade o que aconteceu foi que, ao voltar para casa à noite, foi cercado por vários polícias, que o deixaram inanimado, sem sapatos e sem casaco, num terreno vago, depois de barbaramente espancado, a ponto de lhe partirem a cana do nariz.

Metem-nos de novo no automóvel e levam-nos para a Esquadra do Casal da Boba, na Amadora. Depois de os encostarem a uma parede, o agente Nunes dessa esquadra dá um forte pontapé no estômago de Hezbollah, enquanto outros agentes o seguram e batem para o impedir de se encolher a proteger-se da agressão. Um dos polícias comenta: “Qualquer dia vão encontrar o teu corpo morto na mata de Monsanto”. Tiram fotografias aos dois detidos. LBC é colocado ao lado de Hezbollah e um dos polícias acusa LBC de ter em seu poder um telemóvel roubado. Ele nega e é-lhe devolvido o telemóvel, que lhe tinha sido confiscado e levado para outra sala, depois de verem as mensagens e chamadas.

Foram levados de novo para a Esquadra da Mina. Lá chegados, os detidos repararam na presença do rapaz e da rapariga com quem Hezbollah e LBC tinham trocado palavras que provocaram uma cena de socos entre Hezbollah e o rapaz, na Estação da Amadora.

Repete-se a cena de Hezbollah, ainda algemado, ser agarrado pelos ombros e braços e agredidos a soco no estômago pelo agente Monteiro. LBC interpela-os dizendo “Porque é que estão a fazer isso?” e foi imediatamente agredido a pontapé pelos dois agentes que o enquadravam.

O agente diz-lhe que vai ter de limpar o vomitado com a boca. Hezbollah recusa-se e o agente Monteiro e o agente Ferreira – que tinha tirado o crachá – Insistem: “Vais limpar, vais limpar” e, segurando-o, lançaram-no por cima do vómito e arrastaram-no para trás e para a frente, como se fosse uma esfregona, até o vómito ensopar por completo as calças, o casaco. Num canto ainda ficou um resto de vómito. O agente Monteiro pega no boné de Hezbollah e lança-o sobre esse canto e, colocando-lhe o pé em cima, esfrega-o sobre o vomitado. O agente Monteiro deixou de lhe dar socos mas passou a dar-lhe pontapés, chamando-lhe “porco”.

Os detidos ficaram ali até às onze horas e tal da manhã, altura em que lhes passaram um papel para comparecerem no Tribunal de Alfragide às 10h do dia 14 de Junho e os deixaram sair da esquadra, depois de, pela primeira vez, os desalgemarem. O documento refere-os como arguidos e acusa-os de “agressão à integridade física”, sem referir a quem.

LBC e Hezbollah passaram todo o dia de domingo nas suas respectivas casas (Reboleira e Amadora respectivamente).

Na 2ª feira apresentaram-se ao tribunal, onde encontraram os agentes Monteiro e o outro torturador, o agente Ferreira, ambos à civil. Também estavam presentes o rapaz e a rapariga com quem Hezbollah tinha trocado palavras e socos na Estação da Amadora. Os polícias deram-lhes dois chocolates Twitters. Perante isto, LBC e Hezbollah disseram no seu depoimento que um amigo deles que estava presente naquele episódio e tentara acalmar os ânimos devia ser chamado para o seu testemunho ser confrontado com o deles. A funcionária do tribunal perguntou a Hezbollah se queria um advogado oficioso e ele recusou,. A funcionária tomou nota de toda a ocorrência, e deu a ler o depoimento aos detidos, que assinaram.

O caso vai ser investigado. A funcionária recomendou a Hezbollah que não lavasse as roupas sujas com vómito.

Neste momento Hezbollah e LBC não têm advogado que os defenda e sabem que, se nada for feito para dar publicidade a esta situação, continuarão a ser alvo da brutalidade policial. Foi o que aconteceu com Tony da Bela Vista, Teti, torturado até morrer de hemorragia interna, Angoi, morto com dois tiros nas costas, PTB abatido dentro do carro, Snake, assassinado com um tiro nas costas quando conduzia o seu automóvel, Corvo, abatido com um tiro na cabeça, Kuku, morto aos 14 anos com um tiro a 12 cm da cabeça, Célé, morto com 62 balas, etc”.

Ana Barradas

Publicado em PLATAFORMA CONTRA A VIOLÊNCIA POLICIAL
http://contraaviolenciapolicial.blogspot.com/
Vítimas de violência policial:

Há uma esquerda que não se rende

O drama endémico das Esquerdas, em Portugal, é submeterem reiteradamente as suas linhas estratégicas à visão táctica rasteira e imediatista, que se consubstancia na lógica oportunista do “mal menor”. E isso é por demais evidente no que respeita às próximas eleições presidenciais.

A direcção do Bloco de Esquerda, acantonada numa suposta orientação aprovada na última Convenção Nacional, decidiu de forma leviana e antidemocrática (sem consultar os militantes) apoiar a candidatura de Manuel Alegre sob o pretexto capcioso de “juntar forças para um esquerda grande contra as políticas liberais”. Tal propósito teria “funcionado” se Sócrates e a direcção direitista do PS não tivessem apoiado o candidato. E, convenhamos, Louçã e os seus pares tudo fizeram para “puxar” Alegre para a “esquerda”, como nos recordam as sessões do Teatro da Trindade e da Aula Magna…

O problema é que, na hora decisiva [como no essencial tem revelado], Alegre não só não debitou uma única frase contra o PEC como, ainda para mais, abençoou o entendimento PS/PSD, gorando as intenções bloquistas da “esquerda grande contra as políticas liberais”, colocando-se na posição de candidato do governo, e ao lado de Cavaco na exaltação das “virtualidades” do centrão político.

Ora, isto, para além de colocar a direcção do Bloco numa posição desconfortável [que, seguramente, terá reflexos na sua base de apoio], amputou a possibilidade de unir em candidatura única toda a Esquerda e o movimento social que se tem batido contra as políticas do governo.

Louçã e os dirigentes do BE, ao contrário de se empenharem na procura de uma candidatura que unisse a “esquerda grande”, optaram por partilhar o palanque eleitoral com Sócrates e o PS, isolando-se do movimento social e cavando uma fissura, previsivelmente irreversível, na sua base social mais combativa.

É um problema deles que, sob um certo ponto de vista, até poderá ser positivo, para o deve e haver da história das Esquerdas em Portugal – e clarificador no separar de águas necessário para a construção de uma Esquerda de combate que rompa com as tácticas oportunistas do “mal menor” e construa alternativas!

Chegados aqui, o que se impunha à Esquerda que ficou de fora das eleições? Naturalmente impunha-se dar voz ao movimento social que se tem batido contra o governo de direita e os PEC’s de miséria, buscando entendimentos e unindo esforços para a construção de uma candidatura “contra as políticas liberais”.

É nesse ponto que estamos. A “Proposta de Linhas Programáticas” apresentada por Mário Leston Bandeira – um fundador do Bloco de Esquerda de primeira hora –, vem dar expressão a um movimento informal que se tem revelado através de várias reuniões pelo país, juntado militantes e activistas do BE e de outras Esquerdas num objectivo comum: levar o protesto social às Presidenciais 2011!

Uma tal candidatura, ao contrário de “dividir a esquerda” – como a direcção bloquista gosta de enfatizar –, vai levar às urnas amplos sectores sociais que não se identificam com os candidatos em presença. Ou seja, uma candidatura da Esquerda que não se rende vai mobilizar participação cidadã e denunciar os propósitos antipopulares do triângulo S. Bento/S. Caetano/Belém!

António Alte Pinho

http://esquerda2011.blogspot.com/

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sábado, 19 de junho de 2010

Candidatura de Esquerda às Presidenciais

PROPOSTA DE
LINHAS PROGRAMÁTICAS

Quem se der ao trabalho de ler atentamente a Constituição da República facilmente consegue refutar as interpretações minimalistas quanto aos poderes presidenciais e demonstrar que, ao contrário do que é dito nos meios políticos e pela comunicação social, o Presidente da República dispõe de poderes suficientes para intervir activamente nas grandes opções políticas em áreas essenciais na economia, nos direitos sociais, na preservação dos recursos naturais, na soberania, defesa e relações internacionais.

A direita política que defende os interesses das grandes empresas e do grande patronato odeia e despreza a Constituição da República.

É que a nossa lei fundamental, mãe de todas as leis, apesar das sucessivas revisões aprovadas pelo bloco PS/PSD, resistiu e continua a impor, no essencial, o projecto político que nasceu da revolução social do 25 de Abril. Projecto este que se inspirou em ideias e ideais defendidos pelas diferentes sensibilidades de esquerda que convergiram, sob a pressão dos movimentos sociais, na redacção do documento aprovado pela Assembleia Constituinte em 1976.

A nossa Constituição é uma lei que continua a impor que o país seja governado à esquerda e esse facto explica o ardor militante dos sectores neo-liberais de direita contra esta lei fundamental. Essa imposição explica também por que é que muito do que lá está escrito foi sistematicamente ignorado durante os longos anos de governo neo-liberal PS/PSD.
(...)

Ler mais em:
http://esquerda2011.blogspot.com/2010/06/candidatura-de-esquerda-as.html

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A esquerda que não se rende constrói uma candidatura de combate!

A escravatura moderna

Conforme foi recentemente tornado público, na cidade-fábrica chinesa Shenzen - onde são produzidos alguns dos mais conhecidos instrumentos electrónicos do Mundo, a começar pelo iPod da multinacional Apple - os respectivos trabalhadores ganham cerca de 100 dólares por mês, trabalham num autêntico regime militar, fazendo turnos diários de 12 horas e dormindo em camaratas de 30 pessoas, em condições de tal pressão e desumanidade que só em 2010 já ali se suicidaram 10 operários.

Situações similares foram aliás já identificadas em outras fábricas e empresas em que outros gigantes da economia mundial como a Nike, a Reebok, a Walmart, a Nokia e a Matel subcontratam a produção dos respectivos produtos, inclusive com recurso ao trabalho infantil.

E é à custa destas situações de quase-escravatura que os trabalhadores dos países do chamado "centro" são hoje confrontados com a permanente chantagem de que ou aceitam trabalhar ainda mais e ganhar cada vez menos ou vão para o desemprego porque as respectivas empresas se deslocalizam para aqueles autênticos paraísos da desregulação e da chacina dos direitos sociais e humanos mais básicos.

O que, além de pôr a nu a hipocrisia dos discursos oficiais sobre os direitos humaos que os esclavagistas modernos tanto gostam de apregoar, mostra claramente que a organização e a luta dos trabalhadores a nível internacional é hoje mais importante e urgente do que nunca!

António Garcia Pereira

http://garciapereira2009.blogspot.com/
Foto: DR

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Entre o subsídio e o bloqueio do sistema financeiro: iniciativa só para os grandes?

Há, em cada crise económica, um ciclo vicioso que não resolve nada, nem deixa ver soluções: de um lado uma massa de desempregados, aparentemente sem perspectivas futuras, para quem o subsídio de desemprego, funciona como uma espécie de aspirina; de outro lado, um sistema bancário-financeiro que, atrás da cómoda salvaguarda contra o "mau risco" de crédito, só abre a porta à iniciativa dos grandes (considerando a sua capacidade financeira).

Este é o cenário que o capitalismo, em cada crise, consegue criar: iniciativa para quem tem capacidade financeira, algum subsídio para quem não tem capacidade financeira e perdeu o emprego.

O subsidio de desemprego não é solução para nada! É como tratar uma doença bactériana com uma aspirina ... baixa a febre, mas não elimina a bactéria!

Um desempregado e um micro ou pequeno empresário que resolva ter iniciativa e queira recorrer à banca, também, em 90% dos casos, nada consegue para poder criar alguma coisa produtiva.

Vai sendo urgente criar, à margem do sistema económico-financeiro, mecanismos que formem trabalhadores no desemprego e micro e pequenos empresários sem actividade, na capacidade de recriarem iniciativa cooperativa, mutualista e todas as formas de economia social.

O movimento sindical, o movimento cooperativo, ONGs, partidos que se considerem anti-capitalistas, ... , poderiam ter a iniciativa de desenvolverem acções de formação abertas a desempregados e micro e pequenos empresários.

Não é preciso esperar por alterações eleitorais, não é preciso esperar por mudanças radicais no sistema financeiro, não é preciso esperar pelo socialismo, ... , para, desde já, se desenvolverem acções, cursos, formações que tirem cada desempregado e cada micro e pequeno empresário, do isolamento, de situações muitas vezes depressivas e dramáticas, e os façam redescobrir as vantagens e a possibilidade de execução com sucesso, de iniciativas sociais e cooperativas que criem emprego.

João Pedro Freire

[Foto: uma reunião na Fundação Rosa Luxemburgo, Brasil. Esta Fundação tem desenvolvido bastantes acções de formação na área da economia social]

domingo, 13 de junho de 2010

Basta de teimosia dos governos europeus! Uma Greve Geral começa a estar na ordem do dia!

As sequências de pequenas filmagens, exibem o protesto social que se extende a toda a União Europeia contra as diversas medidas de austeridade e de cortes salariais e nas prestações sociais.

O protesto social não é exclusivo dos trabalhadores dos chamados "PIGS", mas atinge já França e, agora, a Alemanha.

À coesão que os governos europeus parecem demonstrar na execução das suas diversas políticas, o movimento social e dos trabalhadores deveria também responder com a sua coesão e a sua capacidade de resposta.

Todo o movimento sindical europeu, todas as esquerdas que rejeitam o neo-liberalismo e todas as formas de capitalismo, todas e todos os europeus que sofrem as consequências da crise, deveriam responder com a exigência de uma refundação democrática e social da Europa, deveriam responder com um programa alternativo de combate à crise que afirme a necessidade de novas políticas que reforcem todas as formas de democracia, todos os mecanismos de dinamização social da economia, que reforcem as liberdades!

A teimosia da Europa dos Governos e da Comissão Europeia tem de ser exemplarmente combatida! Uma GREVE GERAL EUROPEIA começa a estar na ordem do dia!

http://militantesocialista.blogspot.com/







Direito de inventário(I)

Na história da esquerda, há nomes de que nunca se fala. Esquecimentos que testemunham o empobrecimento intelectual, a falta de debate, a falta de imaginação, a falta de ideias, o controle ideológico apertado que é feito pelas instituições oficiais da esquerda.

A televisão tomou conta de tudo, pouca gente lê, os editores têm que editar coisas que se leiam, precisam de sobreviver.

Os universitários, os académicos, os jornalistas andam mais interessados em promover a sua vidinha. Estamos em plena normalização.

O Bloco de Esquerda organizou há pouco tempo uma série de conferências sobre “os fundadores do socialismo”.
A série começou com Karl Marx e acabou com Mao Tse-Tung. Falou-se também de Lénine, de Trotsky, de Rosa Luxemburgo e de Gramsci.

Quanto a esta lista de fundadores, é obrigatório fazer distinções.

Marx é um fundador? É um fundador, mas de quê? Do socialismo soviético, do socialismo maoista? My god, ele não teve nada a ver com isso, prestemos-lhes ao menos essa homenagem. Aliás, num texto profético teve, como é sabido, a lucidez de explicar que, se havia países onde o socialismo era completamente improvável, esses países eram a Rússia e a China.

Por isso, não misturemos Marx com Lenine e com Mao Tse-Tung. Não responsabilizem Marx pelos crimes do Lenine (e principalmente do Estaline, claro) e do Mao.

Não misturemos também Rosa Luxemburgo e Gramsci com essa clique.

A estes dois mártires do socialismo e dos ideais de libertação da humanidade da opressão e da exploração do capital devemos uma homenagem. A homenagem é obviamente lê-los e actualizá-los. Porque as suas ideias se mantêm actuais, porque a história não terminou com o seu sofrimento. Rosa Luxemburgo abatida pelos social-democratas alemães, António Gramsci nas masmorras dos fascistas italianos.

O BE fixou a sua lista de fundadores, tenho simpatia por Trotsky, era uma inteligência brilhante, um estratega genial, foi uma vítima indefesa perante a paranóia sanguinária do monstro Estaline.

Mas, Trotsky ficará para sempre ligado ao massacre de Cronstadt, à liquidação do soviete dos marinheiros revolucionários.

E, por isso, o Léon também tem a ver com aquela falcatrua sinistra do Vladimir Ilitch Oulianov quando este adoptou a famosa fórmula de marketing segundo a qual o socialismo “era os sovietes mais a electricidade”.

Pois é, Cronstadt foi o fim dos sovietes. Depois disso, do socialismo só ficou a electricidade mais o partido comunista “soviético” e os seus milhões de vítimas.

Pois é, já que falamos de fundadores, não esqueçamos as vítimas.

E não esqueçamos também os muitos outros de que nunca se fala, os ilustres pensadores e militantes, que desde, pelo menos, Proudhon e Bakunin, lutaram por causas da esquerda.

Não está na lista do BE, mas recordemos, por exemplo, Anton Pannekoek.

Pannekoek nasceu em 1873 na Holanda e, além de astrónomo mundialmente reconhecido, foi o principal teórico dos “conselhos operários”.

Participou activamente no movimento operário da Holanda e da Alemanha desde o início do século XX e assumiu posições críticas quer em relação à revolução russa e a Lenine, quer em relação à social-democracia em geral. Pannekoek morreu completamente ignorado na sua aldeia natal em 28 de Abril de 1960.

Quanto aos conselhos operários, para saber o que é que ele pensava, não era má ideia que houvesse um editor arrojado que publicasse Os Conselhos Operários, escritos entre 1941 e 1942.

Para Pannekoek, resumindo, os conselhos operários correspondiam a uma forma de auto-organização dos produtores que, além do papel económico na organização da empresa, deviam também ter um papel político de coordenação social.

Numa carta enviada a um amigo francês em 1952, Pannekoek esclareceu algumas das suas ideias.

“Não esqueça que, quando falamos de ‘conselho operário’, não é para propor soluções, mas para colocar problemas. E que nós, em pequenos grupos, não podemos resolver esses problemas e que não somos nós que podemos preservar o mundo das crises e das catástrofes; e mesmo que se reunissem todos os homens políticos e chefes de organizações para salvar o mundo, eles não o conseguiriam.

Isso só poderá ser conseguido pela força das massas, das classes, através da sua luta prática. Não estamos em condições – e não é essa a nossa tarefa – de imaginar como é que elas o farão.

As pessoas que se confrontam com tarefas que são as suas é que terão que o fazer, desde que sejam capazes disso, claro.

Mas, quando falamos em conselhos operários, não se tratará propriamente de tomar medidas particulares ou de descobrir formas de organização. O que conta é descobrir o espírito que anima as massas. O que importa, o que podemos fazer não é pormo-nos no seu lugar e imaginar como que é que elas devem agir.

Podemos, sim, dar-lhes a conhecer o espírito, os princípios, o pensamento fundamental do sistema de conselhos que se resumem da seguinte maneira: devem ser os próprios produtores a mandar nos meios de produção.

Mas Pannekoek não se limitou à questão da auto-organização dos produtores, aos chamados conselhos operários.

Ele é responsável por algumas das mais brilhantes análises da história política do capitalismo até ao final da primeira metade do século XX.

E algumas das conclusões dessas análises, como mostra a citação seguinte, continuam a ser inteiramente pertinentes e esclarecedoras:

“Confiante em si próprio, o grande Capital pode clamar que os seus interesses coincidem com os interesses de toda a sociedade. Mas sob o domínio do Capital financeiro, as coisas são bem diferentes. Explorar povos estrangeiros, extorquir as economias do seu próprio povo, pela violência e a mentira, tudo isto é sem dúvida usura e vigarice. É por isso que a defesa dos interesses do Capital financeiro deve ser feita nos bastidores através de acordos secretos com políticos influentes. Para que os seus objectivos sejam atingidos é preciso ocupar os gabinetes ministeriais, controlar chefes de partido, manipular deputados, corromper jornais, tudo isso através de negras intrigas que não podem ser divulgadas”.

Mário Leston Bandeira

Editado, também, em A BELA MOLEIRA http://a-bela-moleira.blogspot.com/