sexta-feira, 4 de junho de 2010

Alegre, candidato de esquerda?*

Merece Portugal os políticos que tem, as suas mentiras e as comédias que encenam? Será que os portugueses merecem os castigos que os políticos decidiram infligir-lhes?

É uma verdade indiscutível, uma grande parte dos nossos concidadãos são coniventes na situação a que se chegou e provavelmente estarão prontos para reincidir nas suas escolhas. É a lei das maiorias democráticas.

Tivemos eleições há poucos meses, os eleitores elegeram o Sócrates para um novo mandato. Fizeram-no certamente porque estavam contentes, haverá muitos que andarão agora a queixar-se, mas de quem é a culpa?

É verdade que sempre poderão argumentar que não tinham escolha, que o resultado era inevitável. E talvez tenham razão. É que chegámos ao grau zero da política em Portugal: corrupção, políticos incompetentes e mentirosos, compadrios, promiscuidades de toda a espécie. Um inferno cheio de conformismos.

Continuamos com a mesma nomenklatura socialista no poder, a prestimosa nomenklatura que serve devotamente o seu querido líder, continuam os mesmos quase todos em funções, usufruindo das mesmas alcavalas e privilégios.

Mesmo sem maioria absoluta, aparentemente nada mudou. Na realidade, tudo se agravou, nestas coisas não há milagres, os erros pagam-se caro e, assim, estamos pior do que no tempo da maioria absoluta.

Continuamos com a mesma corte de políticos engravatados, ciosos dos seus privilégios e dos seus benefícios, convencidos de que são imprescindíveis e, por isso, investidos na suprema missão de “governar”, cheios da sua importância.

O que é que se agravou? É que agora estamos mesmo à beira de uma tremenda bancarrota social e sem perspectivas de dela sair.

Apesar de ter arrastado o país para a situação que conhecemos, apesar de todas as falcatruas e mentiras a que recorreu para ganhar as eleições, o Partido Socialista continua, pois, no poder. É que apoios não lhe faltam, mais à direita, mais à esquerda tanto faz. Apoios à direita é natural, a lógica das afinidades electivas, dos interesses tem sempre muito peso.

PS/PSD são partidos gémeos, ambos testemunham a mesma fraude, a de utilizarem uma designação que historicamente os situaria à esquerda. Só que na prática não passam de fiéis serventuários do torniquete neo-liberal inventado nos tempos do Nixon para melhor espremer quem trabalha e lhes retirar direitos.

Há muito que estes partidos perderam a vergonha na cara, vão alternando, ora um ora outro. E, assim, nada de novo aparece na frente ocidental deste jardim à beira mar plantado.

Apoios à esquerda, também não têm faltado. Último exemplo, o apoio do PCP e do BE às grandes obras – o velho mito da esquerda soviética – do TGV Madrid/Poceirão. Sem negociações, sem contrapartidas, sem garantias, esses partidos foram lestos no seu apoio. Também estão com o Sócrates, por mais que barafustem como é que poderão dizer o contrário?

Haverá ainda uma esquerda e uma direita em Portugal? Os banqueiros, os donos do capital dizem que não, que não há diferenças, sobre estas questões metafísicas não têm estados de alma e provavelmente terão razão. É que com os seus amigos políticos, todos partilham o mesmo barco dos interesses. Existe entre eles um fio inquebrável tecido por uma bela solidariedade de interesses.

Uma solidariedade que não parece ter fim à vista. Basta pensar no cenário que se pré-figura para as eleições presidenciais.

O que é que vai mudar com estas eleições? Será que vão mudar a pobreza, as desigualdades, os baixos salários, os sacrifícios de quem trabalha, de quem sofre em horas e horas de transportes, horas e horas de trabalho, horas para levar o filho ao infantário, quando se conseguiu arranjar um, ou à escola? Será que vão mudar as humilhações e o stress no emprego? Será que vão mudar as horas à procura de emprego, a suprema marginalização de não ter um lugar para trabalhar, um salário?

O Presidente-candidato da República não parece muito preocupado com tudo isso, aparentemente tudo lhe corre bem e, assim sendo, vai deixando andar.

Há muito que já devia ter demitido o governo Sócrates, tem poderes para isso. Um governo incompetente e mentiroso que nos desgoverna, um governo fantoche telecomandado por Berlim e por Bruxelas, incapaz de definir um rumo e uma estratégia para tirar a economia da recessão e estimular a criação de riqueza e combater a pobreza e as desigualdades sociais. Um governo que nos leva a cada dia que passa para mais perto do precipício.

O que é que isso interessa ao Presidente-candidato?

Cavaco arranja desculpas esfarrapadas para justificar a sua inércia e incapacidade, argumenta com a crise, não quer alienar o seu eleitorado mais conservador. Ora, é em tempos difíceis, em tempo de crise que se revela o verdadeiro estofo dos grandes políticos. Cavaco um grande político? Deixem-me rir.

O seu pensamento está todo concentrado no que vai acontecer em Janeiro do próximo ano, aparece na televisão, faz uns apelos aos empresários, invistam, criem riqueza. É o seu palco, o seu papel, não se está a sair muito mal.

Está sobretudo preocupado em assegurar mais cinco anos comodamente instalado no remanso do palácio de Belém, nas mordomias, nas vaidades do seu cargo. E nada preocupado pelo facto de continuar a ser uma nulidade, cujo nome será vagamente recordado em nota de rodapé dos futuros manuais de história.

Manuel Alegre? Que acrescentar ao que ficou dito atrás?

Candidato de esquerda, mas qual esquerda?

Alguém conhece o pensamento político deste candidato, alguém detém a informação privilegiada quanto à maneira como tenciona, se por acaso for eleito, intervir na vida política do país? Pelo que consegui perceber, não tenciona intervir activamente, o que significaria descer ao grau mínimo do presidente corta-fitas.

Que pensa Manuel Alegre quanto à redefinição do papel do Estado e do Presidente da República, quanto à Justiça, quanto a um modelo de desenvolvimento económico que assegure justiça social e condições de vida dignas para todos e preserve os recursos naturais?

O que pensa quanto à justiça fiscal e a uma regulação que submeta o capital, os capitalistas e os banqueiros às exigências da ética e da solidariedade sociais, da democracia e da igualdade perante a lei?

Qual o seu pensamento sobre o lugar e os interesses de Portugal na Comunidade Europeia? Haverá, para além desta, outras opções estratégicas, outros parceiros internacionais porventura mais vantajosos para Portugal, diga-nos, esclareça-nos sr. candidato de esquerda?

Candidato de esquerda, mas qual esquerda? Esquerda, direita, esquerda, direita, faz que anda mas não anda como dizem os brasileiros.

Uma esquerda a marcar passo é aquela que temos e que provavelmente continuaremos a ter, uma esquerda impotente e incapaz de tirar o país do pântano em que ele se atolou ao cabo de três décadas de neo-liberalismo arrogante e impiedoso.

Tem a palavra o povo. On verra bien.

*Opinião de Mário Leston Bandeira, publicada em A BELA MOLEIRA http://a-bela-moleira.blogspot.com/

Foto: DR

2 comentários:

  1. Ha neste texto uma intençao de subverter a Constituiçao que é semi presidencialista,e nao ´dá ao PR poderes grandes de intervençao.Todos sabemos que se trata de uma magistratura mais de influencia do que de intervençao activa.
    Por outro lado ,dizer que nao se conhece o pensamento deste candidato,depois de 30 anos de intervençao parlamentar,e alguns outros, como combatente contra o antigo regime,em Argel, e depois como escritor,é querer dizer que se faz tábua de rasa de tudo,ou nao se leu nada.
    Não ha neste texto uma proposta positiva ,alternativa de trabalho, ha simplesmente uma voz de Velho do Restelo,ou o tao habitual bota abaixo,com um ar paroquial,como se nao existisse globalizaçao que a todos concerne, limita,ou expande,"tudo mal", como tudo se esgotasse na luta social,no sindicalismo que hoje tem uma feiçao conservadora.
    Ou seja ,à esquerda da esquerda ,o vazio é igual ao da esquerda tradicional, ou maior, e é pena,porque precisamos de discussao séria,objectiva,serena,pouco adjectivada,e mais substantiva,com apresentaçao de novas alternativas, que possam ser discutidas,sem maximalismos,ou seja sem certezas absolutas .

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  2. De facto conhecemos bem o pensamento deste candidato. Mais recentemente (em entrevista à RTP), manifestou satisfação pelo entendimento PS/PSD, não fazendo uma única crítica ao PEC e às medidas anti-populares do governo. E, mais atrás, deu sempre o dito por não dito: disse não participar na campanha eleitoral e apareceu ao lado de Sócrates. Alegre é o exemplar típico do "agarra que me vou a ele". E para esse peditório já demos.
    E, de facto, precisamops de novas alternativas - por isso aqui estamos. O António há muito que encontrou a dele. E parece feliz com ela...

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