segunda-feira, 21 de junho de 2010

Há uma esquerda que não se rende

O drama endémico das Esquerdas, em Portugal, é submeterem reiteradamente as suas linhas estratégicas à visão táctica rasteira e imediatista, que se consubstancia na lógica oportunista do “mal menor”. E isso é por demais evidente no que respeita às próximas eleições presidenciais.

A direcção do Bloco de Esquerda, acantonada numa suposta orientação aprovada na última Convenção Nacional, decidiu de forma leviana e antidemocrática (sem consultar os militantes) apoiar a candidatura de Manuel Alegre sob o pretexto capcioso de “juntar forças para um esquerda grande contra as políticas liberais”. Tal propósito teria “funcionado” se Sócrates e a direcção direitista do PS não tivessem apoiado o candidato. E, convenhamos, Louçã e os seus pares tudo fizeram para “puxar” Alegre para a “esquerda”, como nos recordam as sessões do Teatro da Trindade e da Aula Magna…

O problema é que, na hora decisiva [como no essencial tem revelado], Alegre não só não debitou uma única frase contra o PEC como, ainda para mais, abençoou o entendimento PS/PSD, gorando as intenções bloquistas da “esquerda grande contra as políticas liberais”, colocando-se na posição de candidato do governo, e ao lado de Cavaco na exaltação das “virtualidades” do centrão político.

Ora, isto, para além de colocar a direcção do Bloco numa posição desconfortável [que, seguramente, terá reflexos na sua base de apoio], amputou a possibilidade de unir em candidatura única toda a Esquerda e o movimento social que se tem batido contra as políticas do governo.

Louçã e os dirigentes do BE, ao contrário de se empenharem na procura de uma candidatura que unisse a “esquerda grande”, optaram por partilhar o palanque eleitoral com Sócrates e o PS, isolando-se do movimento social e cavando uma fissura, previsivelmente irreversível, na sua base social mais combativa.

É um problema deles que, sob um certo ponto de vista, até poderá ser positivo, para o deve e haver da história das Esquerdas em Portugal – e clarificador no separar de águas necessário para a construção de uma Esquerda de combate que rompa com as tácticas oportunistas do “mal menor” e construa alternativas!

Chegados aqui, o que se impunha à Esquerda que ficou de fora das eleições? Naturalmente impunha-se dar voz ao movimento social que se tem batido contra o governo de direita e os PEC’s de miséria, buscando entendimentos e unindo esforços para a construção de uma candidatura “contra as políticas liberais”.

É nesse ponto que estamos. A “Proposta de Linhas Programáticas” apresentada por Mário Leston Bandeira – um fundador do Bloco de Esquerda de primeira hora –, vem dar expressão a um movimento informal que se tem revelado através de várias reuniões pelo país, juntado militantes e activistas do BE e de outras Esquerdas num objectivo comum: levar o protesto social às Presidenciais 2011!

Uma tal candidatura, ao contrário de “dividir a esquerda” – como a direcção bloquista gosta de enfatizar –, vai levar às urnas amplos sectores sociais que não se identificam com os candidatos em presença. Ou seja, uma candidatura da Esquerda que não se rende vai mobilizar participação cidadã e denunciar os propósitos antipopulares do triângulo S. Bento/S. Caetano/Belém!

António Alte Pinho

http://esquerda2011.blogspot.com/

Foto: DR

6 comentários:

  1. Dentro do Bloco, tenho-me manifestado pela convocação de uma Convenção Nacional extraordinária sobre as Presidenciais. Integrei e integro um movimento de 300 bloquistas !
    A proposta de uma Convenção Extraordinária é uma proposta para bloquistas e não uma proposta para toda a esquerda portuguesa. Diz respeito à vida interna do Bloco.
    A divisão das esquerdas é um processo no qual têm responsabilidades todas as principais organizações da esquerda e até activistas sem enquadramento partidário. E quem dividirá as esquerdas nas Presidenciais é tanto Manuel Alegre, como Fernando Nobre, como o candidato do PCP, como qualquer outro que venha aí "em nome da esquerda"!
    Por este motivo, não subscrevo o tipo de criticas que António Alte Pinho faz à direcção do BE. Até porque António A Pinho não conhece a realidade interna do Bloco, do qual não é militante!
    João Pedro Freire

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  2. Em nenhum momento se diz que a "Convenção Extraordinária" [que, aliás, nem é referida] é uma "proposta para toda a esquerda" porque, naturalmente, "diz respeito à vida interna do Bloco".
    Mas as posições públicas do Bloco já dizem respeito a "toda a esquerda" e a toda a gente. E foi a direcção do BE que procurou impingir o Alegre como o candidato da "esquerda grande", não foi mais nenhum outro partido. E para perceber isso não é preciso conhecer a "realidade interna" nem ser militante, basta ser intelectualmente sério!
    Mas, caro JPF, a questão central é esta: quem é o candidato da direcção do Bloco? É o candidato do governo, pois claro!

    António Alte Pinho

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  3. A direcção quis "impingir" Alegre ao Bloco como sendo Alegre o "candidato mais bem posicionado para unir as esquerdas". É este "acto" da direcção do Bloco perante OS militantes do Bloco que foi e é justamente constestado por 300 bloquistas num processo interno do Bloco. Óbviamente, e, ainda bem com visibilidade e transparência para todas as esquerdas, colectivas e individuais.
    Critico politicamente a direcção do Bloco quanto a esta questão das presidenciais e outras. Mas é uma critica que a faço enquanto militante que sou do BE!
    Há outras esquerdas a quem não reconheço a validade das suas criticas, porque essas esquerdas, individuais ou colectivas, também não contribuiram grande coisa para que o cenário para 2011 fosse outro! Algumas remetem-se à cómoda situação de só criticarem o que as principais esquerdas fazem, para depois nunca conseguirem apresentar propostas alternativas!
    Por falar em candidaturas, tanto critico a de Alegre como a abstracta de Fernando Nobre. Alegre e Nobre exibem muito o estado a que as esquerdas chegaram quando se trata de tentar derrotar a candidatura da direita e contribuir para mudar este País!

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  4. Caro João Pedro,
    Ao querer apresentar Alegre como "o candidato mais bem posicionado parar unir as esquerdas", a direcção do Bloco fê-lo publicamente, não só para consumo interno.
    No que respeita às "outras esquerdas", cada um responderá por si, no meu caso (como sabes) tenho-me empenhado na construção de uma candidatura que, não sendo de "todas as esquerdas", poderá ser aquela que leve às presidenciais as bandeiras da Esquerda e o protesto social.
    Ao contrário de ti, reconheço a validade de todas as críticas, porque a Esquerda não é um todo monolítico, nem tem patrões ou timoneiros. E a Esquerda de que falo não se resigna, não se submete a equações tácticas nem a entendimentos de gabinete.
    E seria perigoso condicionarmos a construção de uma candidatura à resolução dos problemas internos do Bloco de Esquerda.
    Em matéria de candidaturas, não me ocorreu ainda falar na de Fernando Nobre - desde logo porque não se reivindica da Esquerda, nem a reconheço como tal!

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  5. Caro António Pinho,
    Reconheço o direito a todo o tipo de criticas, embora não dê a todas a mesma validade.
    Desde 1999, tenho um espaço na blogosfera que é um espaço socialista aberto.
    Nesse espaço, Tribuna Socialista, são sempre benvindas todas as criticas, tendo eu, também, sempre a minha opinião! O Tribuna Socialista é um espaço socialista LIBERTÁRIO. Não é orgão de corrente nenhuma, mas está no espaço da esquerda socialista.
    A minha perspectiva de esquerda socialista não se esgota no Bloco, embora o Bloco seja, neste momento, o pólo principal desse espaço. As esquerdas não estão reféns de nenhuma "vanguarda", nem de nenhum "líder", nem de nenhuma cartilha. Mas também não estão "à solta" ou "ao deus dará". O Bloco de Esquerda foi construído com um contributo diário dos seus militantes. O Bloco é dos seus militantes. O Bloco pode ser discutido por todas e todos. Mas a dinâmica do Bloco diz, em primeiro lugar, respeito a quem a faz (bem ou mal!) e que é a direcção eleita em Convenção Nacional. A critica a essa dinâmica diz, em primeiro lugar, respeito aos militantes do Bloco. Eu, já o disse, critico, apresento propostas, dou as minhas opiniões, fiz parte de uma corrente interna do Bloco. E, confesso, aborrecem-me algumas criticas, como aquelas que fizeste no teu post, porque revelam algum conhecimento do que se passa, no concreto, dentro do BE e parecem basear-se no "diz-se, diz-se" e no "parece que é". Quando ouço essas criticas, dá-me vontade de dizer: entrem para o Bloco, façam cá dentro as criticas perante o concreto e a realidade que virem!

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  6. Caro JP,
    Não tenho nenhum preconceito quanto ao BE. E valorizo muito a acção de muitos dos seus militantes, que conheço, e têm dado contributo importante para os combates da Esquerda. Aliás, eu próprio fui candidato independente pelo Bloco nas últimas eleições autárquicas.
    Mas, ao contrário deles, tenho a liberdade de poder "desferir" críticas mais contundentes.
    Fáço-o apaixonadamente, porque é essa a minha forma de expressar preocupações e reflexões sobre aquilo que me interessa: uma Esquerda de combate, com novas práticas, em ruptura com a cultura da velha esquerda que seca tudo à volta.
    A crítica à direcção do Bloco surge, aqui, porque Alegre é o seu candidato. Porque o BE "oficial" colocou à Esquerda um grave problema: ter de se conformar com o "mal menor" que seria o apoio ao candidato do governo - e isso é inaceitável!
    Aliás, como sabes, em matéria de uma candidatura de Esquerda, sempre defendi que os bloquistas são fundamentais na procura de alternativas. Mas não só!
    Há muito "Povo de Esquerda" que não se revê na candidatura de Alegre e que, embora achando-a legítima, não vê utilidade em votar na candidatura do PCP.
    Portanto, nada da minha posição tem a ver com o "diz-se, diz-se". Pelo contrário, todas as críticas decorrem de posições públicas da direcção do BE.
    António Alte Pinho

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